7.9.09

Diário de Bordo da Rádio Onze

Uma visão da história da Onze, por Rodney Brocanelli

Quinta-feira, Abril 04, 2002

"...Aconteceu em 1995. Eu estava ouvindo rádio numa noite qualquer e acabei sintonizando distraidamente uma rádio pirata. Parei para ouvir e percebi que estavam rolando algumas músicas do Cabeça Dinossauro e entre uma faixa e outra algumas pessoas debatiam alguma coisa da qual eu não lembro mais o que era. Mas não esqueci que a rádio se identificou como rádio livre e que pertencia ao CA XI de agosto da Faculdade de Direito da USP. O que mais me chamou a atenção foi que eles estavam aceitando projetos de programas. Um telefone para contato foi dado no ar, o qual anotei de bate-pronto. Liguei, deixei um recado e tive uma resposta em poucos dias. Era um certo Rodrigo Lobo, estudante da sanfran. Converamos um pouco sobre o projeto da rádio. Perguntei se ela era restrita aos estudantes da faculdade. A resposta foi animadora: a rádio era aberta a toda a comunidade. Disse que estava interessado em fazer um programa e tal. Marquei com o Rodrigo de vistar a Onze num sábado a tarde. Liguei depois para um amigo, o Milton, fiz um convite para que ele participasse dessa empreitada comigo e combinamos de ir lá juntos. Fomos com uns discos e CDs embaixo do braço e um projeto escrito de um programa. Pediram que esperassemos pelo Chico Lobo, que cuidava da parte técnica e artistica da rádio. Ele não demorou a chegar e conversamos. Depois das apresentações e de ler o texto do projeto, Chico proferiu as palavras mágicas: "Vocês não querem entrar no ar? " Nascia assim o Rock Alternativo, um programa que era diário e ia ao ar do meio-dia as três. Tocavamos tudo o que eu e o Milton tinhamos em nossos acervos particulares. Rolava muito Fellini, Mighty Lemon Drops (aquele disco, o World Without End), muitas coisas do Sonic Youth (tocamos Tunic - Song for Karen, faixa que eu nunca ouvi aqui nas nossas errr..rádios de rock), entre outras coisas. Com o tempo, fui me inegrando mais ao dia-a-dia da rádio, fiz muitas amizades lá e comecei a participar de outros programas. Essa brincadeira durou uns dois anos mais ou menos. Deixei a Onze, porque fui cuidar um pouco mais da minha vida. Pouco tempo depois, ela saia do ar devido a problemas com os diretores do lugar onde estavamos (a Casa do Estudante, o centro residencial dos estudantes de direito). Mas a experiência valeu. Nunca me diverti tanto como nessa época. Atualmente, cuido de manter a página da Rádio Onze na Internet. É uma tentativa de manter viva a memória daquela época. Eu tenho aqui várias fitas gravadas com programas meus e programas dos quais eu participei. Outro dia eu tava fazendo um levantamento e tem coisas legais que espero um dia poder colocar na rede mundial de computadores. Muita gente boa foi lá nos visitar: Kid Vinil, Maurício Pereira, etc.
A Onze ainda está fora do ar. Li há algum tempo num site oficial do XI de agosto que se planeja voltar com a rádio, mas não soube de mais nada. Quem sabe um dia ela volta..."

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Segunda-feira, Abril 15, 2002

"Vou voltar a falar da Rádio Onze. Esse assunto é meio que inevitável na minha vida. Afinal, passei dois anos engajado no quadro de programadores da emissora e nos últimos tempos tenho dedicado parte de meu tempo livre para preservar a memória daquela fase da emissora. Algumas pessoas sempre me perguntam pessoalmente ou pelo mail sobre a atual situação da Onze e querem saber os motivos pelos quais ela saiu do ar naquela época, mesmo depois de um relativo sucesso.
Espero poder responder satisfatóriamente a todos neste post.
Tudo aconteceu no começo de 1998. A rádio vivia um momento ruim. Muita gente que estava participando ativamente do projeto resolveu tirar um pouco o pé do acelerador por vários motivos. Primeiro porque o trabalho na Onze era voluntário. Ninguém ganhava nenhum tostão, muito pelo contrário. Eu mesmo cansei de colocar dinheiro do meu bolso para certas coisas lá. Cada um de nós, salvo raras exceções, tinha seu emprego fixo. As responsabilidades de cada um que estava empregado naquela época foram aumentando progressivamente e assim ficou dificil de conciliar as duas atividades num dado momento.
Então, depois de dois anos nos quais trabalhamos ativamente, o pique começou a cair. Além da questão colocada acima, outro motivo contribuiu para a queda: o ambiente interno não estava bom. Um episódio desgastou demais as pessoas. Era o debate sobre certos excessos de linguagem (traduzindo: palavrões) que alguns programadores estavam cometendo no ar. A Rádio Onze sempre primou pela liberdade estética, isso eu posso testemunhar. Mas não nos esqueçamos de que a emissora era uma rádio livre, sem concessão do governo para seu funcionamento, etc. Lembro de uma frase dita pelo Chico Lobo certa vez: "nós estamos sendo ouvidos pelos nossos amigos e pelos nossos inimigos também". Qualquer deslize ou desatino poderia servir de munição para quem não gostasse da gente. O problema não era nem moral, muito menos estético. Era político mesmo. As pessoas que estavam envolvidas nessa história dos excessos não entenderam nossas argumentações. Em vez de jogar em favor do time, preferiram continuar atuando para a torcida. Deu no que deu. O desgaste foi aumentando cada vez mais e quem estava ativamente ligado aos destinos da Onze passou a largar o projeto aos poucos num sinal de desânimo.
Mas o pior estava por vir.
Diz um velho ditado que quando se está dividido, um exército é mais fácil de ser vencido. Como a Onze estava desse jeito, o golpe que viriamos a sofrer foi mortal. O então diretor da Casa do Estudande (prédio residencial dos estudantes de direito da Fadusp e local onde estavamos) passou a nos criar uma série de dificuldades. O nome dele era Rodrigo. Como diretor, ele achava que a Onze causava uma série de problemas vividos na Casa, o que não era verdade. Ele dizia que a rádio era responsável pelo fato de pessoas "estranhas" transitarem pelo prédio, mas não se definiu quem se encaixava nessa categoria. Quando a Onze estava em pleno funcionamento, recebiamos a visita de cantores, atores, escritores, músicos e jornalistas para divulgarem seus trablhos e participar dos programas. Fizemos entrevistas ao vivo com músicos do porte de Kid Vinil e Maurício Pereira, entre outros. Quisera eu ter uma frequencia de gente estranha como essa em meu prédio. Voltando ao diretor da Casa, ok a função dele era essa mesma, apontar o que está certo e errado e propor soluções, mas ele acabou agindo com muito autoritarismo e se mostrou pouco afeito ao diálogo. O tal do Rodrigo chegou até a trocar as fechaduras da rádio, numa atitude extremista. O que o Minsitério das Comunicações, a Polícia Federal, a Anatel nao conseguiram fazer na época em que tocávamos a Onze, uma só pessoa fez: nos tirar do ar.
Depois, várias reuniões com a presença desse diretor e alguns integrantes da rádio acabaram se realizando. Um acordo acabou saindo, mas aí o estrago já estava feito. Com a Onze fora do ar, os programadores se desmobilizaram e não houve mais vontade de se continuar a tocar o projeto. Foi aí a primeira morte da Rádio Onze".

posted by Rodney Brocanelli | archived 12:42 AM

Domingo, Abril 21, 2002

"No post anterior referente a Rádio Onze eu terminei o texto falando sobre a "primeira morte" da emissora. Então, se houve a primeira, consequentemente aconteceu uma segunda.
Em 1999, alguns estudantes da ECA-USP (Escola e Comunicações e Artes) fizeram um acordo com o XI de agosto e chamaram para si a responsabilidade de continuar tocando a programação da Onze. Não tenho os detalhes de como transcorreram as negociações, até porque eu descobri essa informação por acaso. Eu estava buscando na Internet listas de discussão sobre rádio e uma delas me chamou a atenção. Era a radioxi, lista que o povo da ECA fez para ajudar na comunicação interna. Me inscrevi nela e somente depois é que eu descobri o que estava acontecendo de fato. Fiquei um tanto chateado porque eles ignoraram todo o trabalho que havia sido feito entre 1995 e 1997. Em nenhum momento eles pensaram em chamar as pessoas que roeram esse osso por dois anos para conversar, trocar experiências e, quem sabe, dar uma força nessa nova fase. (Cá entre nós, uma atitude típica de estudantes da USP que acham saber de tudo mesmo antes de concluir o curso). Depois que eu entrei na lista de discussão, deixei bem claro essa minha posição. A partir daí, eles se tocaram da burrada feita e uma reunião for marcada, da qual participou o José Roberto Reder Borges, representando o povo antigo da Onze.
Apesar dos pesares, essa associação tinha tudo para dar certo. Afinal, era a união de duas forças unversitárias importantes do quadro estudantil brasileiro. A coisa não foi para frente devido a alguns fatores, o principal foi a inexperiência. Os alunos da ECA não tinham a devida tarimba no que diz respeito a esse mundo complicado que é o das rádios livres. Um técnico em eletrônica os passou para trás. Nós deixamos lá um transmissor novinho em folha, já montando, que só necessitava de manutenção. O espertalhão os fez comprar um novo. Poderiam ter economizado alguns preciosos trocados que conseguiram do XI de agosto para investir mais na Onze.
A fase do povo da ECA na Rádio Onze acabou de forma arbrupta. A fiscalização da Anatel, mais a PF apreeenderam os equipamentos. Isso nunca tinha acontecido na história da emissora. Porém, o mais irônico é foi o primeiro fechamento de uma rádio que não estava no ar. Parece mentira, mas a Onze ainda não tinha voltado a transmitir regularmente. Ainda não haviam ocorridos os primeiros testes de transmissão. Até então a única coisa que tinha saido do papel foi a reforma dos estúdios localizados na Casa do Estudante. Me disseram depois que a apreensão aconteceu a partir de uma denúncia feita a Anatel. Eu tenho uma idéia de onde possa ter partido a delação, mas não revelo minha opinião nem sob tortura chinesa.
O XI de agosto tomou as devidas providências no âmbito jurídico e o processo depois foi arquivado. Com o fechamento, o estusiasmo do pessoal da ECA diminuiu. A tal da lista de discussão está abandonada. A grande derrotada mesmo foi a Rádio Onze, que até hoje permanece calada".

posted by Rodney Brocanelli | archived 10:32 PM

Sexta-feira, Junho 07, 2002

"Eu não tava a fim de postar mais nada hoje aqui no blog, mas eu lembrei de uma histórinha interessante que eu resolvi dividir com a meia dúzia de leitores fiéis dessas linhas.
Bem, quem me conhece sabe da minha participação na Rádio Onze. Eu era uma espécie de faz-tudo. Fui repórter, operador da mesa de som, assessor de imprensa, participava de vários programas, mas além de tudo isso tinha um programa solo que ia para o ar todo sábado à noite. Era o "Saturday Night Rock". Não procurem significado algum no nome. Foi o primeiro que apareceu (idéia do Chico Lobo), e ficou.
Tinha a oportunidade de tocar as minhas bandas preferidas (e de muita gente também..he he he), como Suede, Sonic Youth, Fellini, etc. Numa certa altura eu passei a tocar as demos de bandas que estavam militando no emergente rock indie nacional. Abri espaço para Superbug, Walverdes, PELVs, Cigarrets, Comespace...as minhas preferidas eram Sleepwalkers e Arsene Lupin. Fiz contato com elas através das listas de discussão que eu assinava. Teve um dia em que montei um programa só com essas bandas num dia útil bem em cima da Voz do Brasil. Naquela época ainda havia a obrigatoriedade para a transmisão do informativo do governo por parte das FMs oficiais. Até dei um nome meio gaiato para esse especial: "Indie-Brasil contra a Voz do Brasil". Bons tempos.
(divaguei tanto agora que fugi do assunto...he he he, mas foi bom esse parêntese).
Bem, um de meus projetos era entrevistar personalidades interessantes do rock and roll. O sucesso da entrevista que o Kid Vinil nos tinha concedido no final de 1995 animou para que essa idéia fosse levada adiante por mim. Uma das personalidades que estava fazendo um certo sucesso lá fora era a brasileira Isabel Monteiro, vocalista do Drugstore. Achei que valeria a pena tentar manter um contato com ela, para, quem sabe, convencê-la a visitar nossos estúdios quando estivesse em férias aqui no país e nos concedesse um depoimento. Naquela época, eles tinham lançado o primeiro álbum, e o Drugstore começava a fazer sucesso na Inglaterra. Consegui por aqui o endereço da caixa postal de Isabel com o próprio Kid, copiei a fita com a entrevista ele na qual ele falou um pouco sobre a banda, escrevi uma cartinha e despachei tudo via Sedex. Algum tempo depois, chegou a resposta. Num bilhetinho, Isabel disse que amou a entrevista, ficou muito feliz, etc (nem sei mais onde está essa carta). Ela ainda me mandou um adesivo de mesa com o logo do Drugstore e, melhor que isso, deu o meu endereço residencial para o produtor que estava gerenciando a carreira deles naquele momento e passei a receber quase em primeira mão os singles que estavam sendo lançados. Por conta disso, eu tive o privilégio de ter em minhas mãos antes do que muita gente boa o single "The President", aquela música na qual ela canta em dueto com o Thom Yorke. O MP3 estava engatinhando...
Bem, a essa altura você deve estar se perguntando se a entrevista rolou. Não. Primeiro, porque eles tiveram problemas de gravadora. Sairam do Go Discs e foram para a Roadrunner numa transação meio complicada. Acabamos perdemos contato. Ainda enviei outras correspondências, mas as mesmas voltaram. Aquela caixa postal havia sido desativada. Depois, quando a banda veio ao Brasil, a emissora já não estava mais no ar e por falta de tempo não me animei a ir atrás dela. Mas pelo menos eu acho que em algum lugar da casa de Isabel tem um pedaço da memória da Rádio Onze".

posted by Rodney Brocanelli | archived 11:27 PM

Sábado, Agosto 17, 2002

Tou devendo um post pra Mimi sobre um amigo meu que é a cara do Lester Bangs, o crítico musical que está sendo "hypado" pelo pessoal da revista Zero. Eu conhecia o trabalho de Bangs, mas não tinha visto ainda a sua foto. Quando li a reportagem que saiu na primeira edição tomei um susto. Parecia que eu estava vendo meu grande parceiro de Rádio Onze, José Roberto Reder Borges.
Quem aí lembra de uns cartazes que volta e meia apareciam colados nas paredes de São Paulo com frases de efeito contra os políticos assinados por um certo Partido Abstrato Tropical Onírico (Pato)? Reder Borges, proprietário de uma modesta gráfica de lambes-lambes na Av. São João, era o responsável por eles. Dono de um senso de humor bastante apurado e com uma agilidade mental ímpar, ele preenchia os muros da cidade com a sua visão bastante peculiar das coisas. Anarquista convicto, ele encontrou nos cartazes uma forma de protesto contra o então governo Collor, em 1991. A idéia deu tão certo que o amigo do PC Farias deixou de ser o alvo preferencial e outros políticos de diferentes tendências também entraram na dança. Luiza Erundina, Orestes Quercia, Paulo Maluf, FHC, Itamar Franco...nenhum deles foi poupado pela irônia de Reder Borges. O forte estava nas frases de efeito: "O Brasil tá uma Mesbla" (citação ao estado falimentar da prestigaida loja de departamentos), "Adib, aqui Jatene imposto demais" (contra o IPMF), "Itamar, a burrice ofusca" e "Votou no PT, tomou no IPTU". "Reder exerce sua cidadania através do riso", observou bem o jornalista Alceu Luis Castilho num perfil publicado no tradicional "O Estado de S. Paulo", em 21 de setembro de 1996.
Reder Borges fez parte do quadro de programadores da Rádio Onze e foi um de seus integrantes mais ativos. Levado para lá por Chico Lobo, conquistou a todos com sua simpatia. Sua parceiria com a Onze trouxe grandes frutos para ambas as partes. Foi ele quem deu a idéia de fazermos uma campanha contra a reabertura do Elevado Costa e Silva, o Minhocão, ao trafego noturno, isso em 1996. Na época, o então prefeito Paulo Maluf tinha esse plano, o que causaria muito mais transtornos aos moradores dos prédios que circundam o viaduto. A resposta veio através da campanha "Maluf, deixe-nos dormir em paz". Além dos cartazes de Reder, foram incluidas vinhetas na programação da Rádio Onze explicando o que queriamos e quais seriam os malefícios de tal decisão do prefeito. A campanha foi um sucesso de público e mídia.
Reder era o rei das terças-feiras da Rádio Onze, as 19h, o horário nobre da emissora. Não transmitiamos "A Voz do Brasil" e colocavamos no ar os programas de destaque. Em vez de ir para a faculdade, lá estava eu nos estúdios para ajuda-lo no comando do programa. Fazia a mesa de som e dava uns palpites também. Em meio a várias músicas de Led Zeppelin, Bread, Elton John, eu e Reder tentavamos analisar a conjuntura política do país, sempre com muito bom humor. Ele foi um dos que ficou na Onze até o seu final.
Hoje, Reder mora em Barueri e eu estou lhe devendo uma ligação telefônica. Ainda não tive a oportunidade de dizer que ele é a cara do Lester Bangs.

posted by Rodney Brocanelli | archived 5:24 PM

Os textos acima foram originalmente escritos para meu blog pessoal, o Onzenet e um tanto perdidos entre vários posts que tratavam de outros assuntos. A idéia de se juntar tudo num lugar só é mais uma contribuição para contar um pouco mais da história de uma das rádios livres mais bacanas de São Paulo.(Rodney Brocanelli)

13.2.06

Jabá

Coloquei dois novos blogs no ar:

http://blogslabpop.blogspot.com - Complia os textos que fiz para a coluna de blogs do site Laboratório Pop.

http://jornalismomusical.blogspot.com - Compliei aqui a maioria das entrevistas que eu fiz com personalidades do jornalismo musical (Lúcio Ribeiro, Marcel Plasse, Ricardo Alexandre & cia.) para sites como o Observatório da Imprensa. Na verdade, é a versão demo de um livro que eu desejo publicar sobre esse assunto. Quem sabe algum editor de livros olha e se anima com essa minha idéia. Se a Bruna Surfistinha teve seu blog transformado em livro, por que o meu também não pode...he he he

9.2.06

O contador de histórias

Cadão Volpato é um contador de histórias. O que o diferencia dos demais é o fato de conseguir usar duas manifestações artísticas para se expressar: a música e a literatura. Neste ano ele lançou ao mesmo tempo seu primeiro CD solo, chamado Tudo O Que Eu Quero Dizer Tem De Ser No Ouvido (Outros Discos), e seu terceiro livro, Questionário, (Iluminuras). Além dessa prolífica produção, seu currículo artístico-profissional tem pontos altos como letrista e vocalista da banda Fellini, apresentador do programa Metrópolis (TV Cultura-SP) e editor de cultura da revista Época. Mesmo com tantas atividades, ele foge do rótulo de multimídia. "Faço algumas coisas porque tenho um talento natural e uso isso. Trata-se de uma palavra tão antipática. Parece que a pessoa faz tudo mal", diz. Em seu disco de estréia, Cadão resolveu fazer tudo sozinho (e bem feito), desde o processo de composição até a gravação das músicas. Seria a radicalização do lema punk "do it yourself" em nome da simplicidade. "A minha idéia era fazer uma coisa simples. Como diz o Jorge Drexler, é uma coisa de ´canta-autor´. São baladas", afirma. Duas canções se destacam por essa faceta de "contador de histórias". Em "Carrossel", ele fala do pintor francês René Magritte. "Ele conheceu sua mulher em um carrossel. Eles se apaixonaram só de se olhar, mas foram se casar sete anos depois", diz. "Ela e os Beatles" fala de Astrid Kirshner, fotógrafa alemã que registrou a primeira fase da carreira daqueles quatro rapazes que iriam ser famosos anos mais tarde. "A história dela veio de uma Rolling Stone especial sobre o George Harrison na qual havia várias fotos dos Beatles tiradas nos tempos de Hamburgo. Eles tinham uma relação muito legal", afirma. Se em seu CD Cadão pegou referências externas, a gestação de Questionário foi diferente. "Eu inventei um processo. São 30 perguntas aleatórias para personagens, cujas respostas têm uma relação entre si. São alguns blocos de perguntas relacionadas com um mesmo período. Digamos que elas avancem do final dos anos 70 para meados dos anos 80. Eu criei uma espécie de monólogo, uma coisa meio teatral", diz. Outra de suas características é o fato de que que ele não deseja passar nenhuma mensagem. "Eu quero contar coisas que me emocionam, e isso é poesia. Se isso sai da minha mão de uma forma que emociona as pessoas, é o que importa para mim".


Esse é o original do texto que saiu numa das edições da Rock Press do ano passado. Só não lembro de qual mês. Isso é só um resumo. A entrevista que fiz com Cadão (em quase que sua totalidade) pode ser lida no Bacana

8.2.06

Eu queria ser Odair José

Finalmente o Brasil entrou na onda dos tributos artísticos. Prática comum lá fora, esse tipo de trabalho tem retorno garantido juntos aos fãs, sejam os do homenageado ou daqueles que homenageiam. O Tributo a Cazuza, que gerou filhotes em CD ou DVD, é um exemplo bem acabado disso. Um dos próximos a sair, ainda neste segundo semestre, tem foco na história de um artista controvertido, Odair José. Seu diferencial é conseguir uma proeza ímpar aqui no país que é colocar lado a lado artistas tanto da cena independente, como os artistas que estão no manistream.

O selo independente Allegro Discos, do Goiânia, prepara uma coletânea chamada "Vou tirar você deste lugar". Serão 20 faixas com recriações dos grandes sucessos de Odair. O mainstream se faz representado por Zeca Baleiro (Eu, você e a praça), Pato Fu (Uma lágrima) e o titã Paulo Miklos (Vou tirar você desse lugar) e a recém-promovida Leela (E ninguém liga para mim).

A cena independente comparece com bandas de peso, entre outras, como o Columbia, que ficou com "Eu queria ser John Lennon" uma das faixas mais representativas da carreira de Odair. "Cotidiano nº 3" ficou a cargo Los Pirata. Há até espaço para um nome dos anos 80: Picassos Falsos, que regravaram "Essa noite você vai ter que ser minha".

Sandro Bello, idealizador da homenagem e proprietário da Allegro Discos, comemora esse casamento que ele jura não ser proposital: "Conseguimos com esse tributo unir dois mundos distantes, o alternativo e o mainstream que não costumam se comunicar no dia-a-dia". Segundo ele, a escolha das bandas se deveu a afinidades de estilo com o trabalho de Odair José. Prova disso, para Sandro, foi o convite ao Pato Fu. O guitarrista John diz ver claramente um grande valor genuíno em sua obra. E acrescenta: "Nossa participação não foi em tom de sátira. Muito já foi feito desse modo em cima dos artistas chamados ´bregas´ e acho que isso inclusive já perdeu a graça. Tentamos fazer algo à altura".

Mesmo quem não tem tanta identificação com a obra de Odair José passou a ter uma visão diferente de sua trajetória após participar desse projeto. É o caso de Paco Garcia, guitarrista do Los Piarata. "Eu não conhecia tanto os discos e me aprofundei mais na sua discografia. Tem coisas muito boas". "Cotidiano nº3", faixa que a banda vai defender, tem letra em espanhol. "Foi muito divertido para nós gravarmos essa canção", afirma.

Diferente do que foi notíciado, o tributo a Odair José não vai contar com aquela que seria a cereja do bolo: a regravação que o Los Hermanos fez para "Vou tirar você desse lugar". Apesar da boa receptividade que Marcelo Camelo e seus colegas tiveram à idéia, problemas burocráticos impediram a inclusão da faixa.

Odair José já ouviu as faixas que farâo parte da coletânea e deu sua aprovação. "Ele gostou de todas, mas não deixou de apontar um certo estranhamento com algumas mudanças de arranjo", diz Sandro. No total, foram 35 convites para depois se chegar as 20 faixas. Algumas bandas não puderam participar por não conseguirem arcar com os custos de estúdio, caso do Autoramas.

Toda a popularidade de Odair veio acompanhada de grande polêmica na época em que atuou mais ativamente. Ele foi um dos maiores vendedores de disco do país e ganhou o título de "Bob Dylan da Central do Brasil". Mesmo assim, ele sofria o preconceito de uma grande parcela da dita "elite cultural", que resumia seu trabalho aos adjetivos "brega" e "cafona".

Mesmo sob tanta contestação, as músicas de Odair José são consdieradas mais contestadoras e provocativas que grande parte da produção da MPB daquela época. Nenhum outro artistia falou de temas tabus, como a prostituição, drogas, adultério e outras coisas bem barra-pesada como ele, numa época em que o regime militar viva seu apogeu. A coletânea seria uma ótima chance de apresentar Odair e contextualizar seu trabalho a uma nova geração.


Essa é a versão não-editada da matéria sobre o tributo a Odair José que eu fiz para a sétima edição da revista Laboratório Pop, publicada em outubro. Ela foi adaptada depois para o tamanho que estava disponível. Posso estar enganado, mas acho que foi a primeira revista a falar desse projeto, que saiu no início desse ano. Até então, ele só era notícia em sites da Internet . Recebi hoje um mail de Sandro Bello no qual ele comemora o fato da primeira prensagem do tributo ter se esgotado, graças aos pedidos dos lojistas.

26.12.05

Gay Talese

Virou moda aqui no Brasil prestar culto a jornalistas estrangeiros.

Talvez porque não temos mais a referência Paulo Francis.

Mas essa é uma outra discussão.

O fato é que hoje nós lemos e ouvimos falar bastante de jornalistas como Hunter S. Thompson, Lester Bangs, Tony Parsons.

E cada jornalista (ou aspirante a) brasileiro adota um deles ou qualquer outro como fonte de inspiração.

Se isso é bom ou ruim, também é outra conversa à parte.

Eu adotei como referência Gay Talese.

E não é de hoje. Vem desde 1988, quando li um perfil sobre ele e a tradução da introdução de "Fama e Anonimato" na revista Imprensa.

Tive a oportunidade de escrever sobre ele no Bacana.

Quem sabe um dia eu escreva como ele.

Graças a Gay Talese, aprendi que as atitudes falam mais que as palavras, as vezes.

Só que agora ele resolveu soltar o verbo em entrevista à Folha de S. Paulo.

E não poupou ninguém.

Eis alguns trechos representativos:

"Os editores buscam se dissociar do que Judith Miller escreveu inadvertidamente ou preconceituosamente. Pode-se dizer que ela se tornou porta-voz dos neoconservadores, ansiosos para invadir o Iraque. Mas ela não publicou seus artigos, só os escreveu. Havia até dez editores que estavam ali para revisar seus artigos antes de as manchetes serem escritas"

"O 'New York Times' ama o poder, é o que temos de mais próximo nos EUA de um jornal do estabilishment"

"(...)fontes devem ser expostas. No meu trabalho sempre dei nome às fontes. Eu jamais aceitaria uma informação sob a condição de não dizer ao leitor quem é minha fonte. Tudo bem, temos o escândalo Watergate e o garganta profunda, mas acredito que em 80% das notícias com fontes não identifica das o repórter simplesmente foi preguiçoso demais para apurar direito e seduzir suas fonte"

"Um outro problema é que há repórteres demais em Washington. Milhares deles. Circulam com as mesmas pessoas, são como pássaros bicando a mesma informação. Comem, mastigam, cospem, engolem de novo. O que eu faria, se ocupasse um cargo executivo em um jornal, seria retirar muitos desses repórteres de Washington. Eu os mandaria para as capitais dos 50 Estados dos EUA"

Comentário: dá para aplicar esse conceito de Talese ao Brasil. É a velha história, menos Brasília, mais Brasil.

"Foram os editores que deixaram que Jason Blair colocasse seus artigos no jornal. Ele escreveu 67 reportagens para o jornal.O jornal culpa Blair e o demitiu, mas os culpados estão no topo. Se a família Sulzberger administrasse a General Motors, a CBS ou a Sony e cometesse tantos erros os conselhos de administração já teriam se livrado deles"

Outro comentário: mais um conceito que se pode aplicar em casos recentes que tivemos aqui no Brasil.

E tem muito mais de onde vieram essas. Uma entrevista imperdível.

13.12.05

O rádio nunca mais será o mesmo

Bob Dylan vai apresentar programa de rádio

O músico Bob Dylan confirmou nesta terça-feira que vai apresentar um programa semanal de rádio em uma rede de estações digitais nos Estados Unidos a partir de março do ano que vem.

Leia mais aqui

Comentário do blog: esse é Bob Dylan, cada vez surpreendendo mais, desde que trocou o violão pela guitarra elétrica. Antes foi um livro, depois um documentário e agora um programa de rádio. Nada mau para quem tem fama de arredio. Dylan nunca se expôs tanto como nos últimos tempos.

Presente de Grego?

O meu Hotmail agora tem 250MB.

O que fazer com tanto espaço?

E mais: será que eles não vão cobrar por isso no futuro?

Tomara que não seja um presente de grego.